Poemas de sombríos :  LEVEM-ME E COLEM-ME À PEDRA
Passo os dias deitado
E as noites também,
Já estou bem treinado
Para o tempo que aí vem.

Quando a data chegar
Já estarei habituado
A dormir sem acordar
Ninguém fique admirado.

Não precisarei depois
Nem sequer lavar o rosto
Um só, eu não tenho dois
E nisso tenho muito gosto.

O tempo passará, passará,
E terei alguns visitantes
E o meu corpo servirá
Para regalar esses meliantes.

E se houver pescadores,
Sirvam-se, estejam à vontade
Asticots de várias cores
Digo isto sem vaidade

Depois de bem limpinho
Levem-me e colem-me à pedra,
Bem à vista e coladinho
Na velha Igreja em Évora.

A. da fonseca
Poeta

Sonetos :  MORTE QUE NASCESTE COMIGO
Estou cansado da vida, estou cansado de padecer.
Comecei a sofrer à nascença e continuei a sofrer.
Já não quero já não posso assim contigo continuar
Mas não te darei o prazer de um dia me matar.

Vou fazendo resistência reforçando o meu moral.
Não contes com a minha ausência, só se for casual.
Vou sofrendo, vou vivendo, quero continuar a rir.
Não quero que outros sofram se não souber resistir.

Morte que nasceste comigo comigo hás-de morrer.
Não conseguirás resistir também te farei sofrer.
Morrerás com a mesma idade aquela que eu terei.

Depois eu quero ver se tu ficarás contente,
Sabendo que as tuas irmãs fizeram morrer tanta gente.
Mas eu te levarei comigo e comigo te enterrarei

A. da fonseca
Poeta